Após suspensão da eleição para presidente da Federação Aquática Norte-rio-grandense, por determinação judicial, como fica a situação da natação e de outras modalidades envolvidas? Em quê os atletas e equipes são afetados, quais as expectativas, a medida acaso foi um "mal necessário"? Em que isso pode implicar para as demais federações do Brasil?
A princípio, a temporada de competições oficias das modalidades aquáticas no RN está suspensa. Ou seja, não é possível ser lançado qualquer calendário nem regulamento até que a questão seja resolvida pela justiça.
O que foi questionado e acatado diz respeito à forma como a eleição se deu, no último dia 20 de dezembro de 2024. As entidades: Associação Potiguar de Polo Aquático, Associação de Nadadores Masters do RN e Associação Desportiva de Natação Pajuçara acusam a Federação de várias irregularidades, afirmando não haver "obediência às regras legais, permitindo que a única chapa inscrita fosse indicada por filiados em condição irregular".
Além disso, as acusações recaem na suposta "violação ao princípio da impessoalidade" e na afirmação de "ilegalidade em se considerar o Clube Esportivo Neves e o Aeroclube como clubes regulares e aptos a exercerem direitos de filiados". Com isso, outras acusações também estão sob análise da justiça, tendo sido determinada de imediato a suspensão da eleição pelo Desembargador João Rebouças do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Norte.
Temporada 2025 suspensa
Com essa determinação judicial, a temporada de competições tanto de natação quanto das demais modalidades ficam suspensas igualmente. Os atletas terão que seguir treinando até decisão judicial que valide a eleição da FAN e assim seja reconhecido seu presidente legalmente ou mesmo, reordene como as coisas deverão suceder a partir de então. Caso atletas precisem bater tempo como índice para campeonatos importantes como regionais ou brasileiro, infelizmente a situação se complica ainda mais, por não haver condições de reconhecer tempos oficialmente aqui no RN.
Equipes também não podem renovar seu cadastro na federação, tampouco utilizar competições com a logomarca da federação em temporadas anteriores como marketing para disseminação da natação. Atletas de Águas Abertas que concorreram nos circuitos dos anos anteriores estariam impedidos de iniciarem a temporada com a primeira competição da CBDA programada para o dia 15 de fevereiro.
Expectativas
Desde 1970, desde a fundação da Federação, o método de eleição para presidência da entidade que rege os esportes aquáticos no RN nunca mudou. Acaso seria justo apenas dois ou três representantes de clubes decidirem por mais de 400 atletas envolvidos? A questão é que o estatuto da FAN seguiu o mesmo modelo de tantos outros estatutos de entidades esportivas aqui no RN. Na mesma condição da federação em que se enquadre pela legislação, existem associações aqui no RN cujo método de eleição se restringe apenas à diretoria com 02 ou 03 diretores. E esses métodos não precisariam estar discriminados, mas amparados pela legislação de modo a abranger todo o público envolvido, no que entendemos por "democracia".
Contudo, a pesar de a legislação atual obrigar adequação, o que a comunidade aquática poderia ansiar, no mínimo, seria um processo semelhante ao processo eleitoral da CBDA. É o que podemos conjecturar para que os técnicos responsáveis por equipes se inteirem da importância de sua participação e influência determinante na sugestão de mudança do estatuto da FAN, tão logo a justiça reconheça sua legalidade. É com a mudança do estatuto que podemos legalmente abranger a comunidade aquática a partir de todas as equipes federadas, em especial, os representantes dos atletas de cada modalidade, os diretores da federação até quem sabe, mensurar por peso de votos, permitindo que equipes das escolinhas e do master também tenham direito a voto no processo eleitoral.
Um "mal necessário"
Atletas e equipes foram pegos de uma forma que poderia parecer "injusta" diante da continuidade pretendida para a presidência da FAN. No entanto, desde 2017, publicamos matéria analisando a situação da época diante de insistentes protestos de técnicos e atletas que não queriam ser identificados (confira no link). Trechos da matéria em 25 de fevereiro de 2017:
"(...) Apesar de reconhecer a eleição de Galega em seu 5º mandato, o processo de eleição previsto no Estatuto da FAN continua fiel à forma como foi concebido desde que a FAN foi fundada. Os tempos mudaram, a natação se modernizou, porém continuar com apenas 03 entidades votantes não parece uma eleição tão democrática assim, se contextualizarmos a época em que o Estatuto da FAN foi concebido em comparação aos tempos atuais.
"Na década de 1970, havia praticamente os 03 únicos clubes que fundaram a federação e que promoviam a natação. Talvez, estimássemos 20 ou 30 atletas no máximo participando daquelas competições. Hoje tivemos 10 entidades vinculadas à FAN no campeonato estadual de natação em 2016, sem contar as do nado sincronizado, das escolinhas e do máster. Um público estimado em quase 400 atletas de 30 a 40 entidades"
Assumimos a responsabilidade de questionar o mesmo método de eleição mantido há décadas, mas que não demonstrava abarcar uma realidade "democrática" de escolha da presidência da Federação.
O que ainda precisa ser enfatizado com insistência é a capacidade de separar uma função pública da pessoa que se relaciona com a comunidade aquática. É tendencioso que durante anos, o cargo de presidente acabe se confundindo com o relacionamento criado pela comunidade aquática. No entanto, a dinamicidade do processo democrático exige que o interesse público seja maior (e bem maior) do que o interesse particular ou individual. E é nesse quesito que encontramos um "mal necessário".
Assim como conseguimos passar pela pandemia de covid-19, certamente passaremos bem melhor esse período de análise e discernimento a depender de uma decisão jurídica. Em que isso pode implicar para as equipes de federados e não-federados, sabemos que o constrangimento é apenas momentâneo, e que no final, poderemos perceber que esta é a oportunidade da devida readequação para atualização do estatuto da FAN de modo mais abrangente democraticamente.
Estatuto da FAN concebido durante ditadura militar
Ao manter-se inerte quanto à forma de eleger a presidência da Federação durante todos esses anos, o estatuto da FAN ainda carregava trechos tendenciosos da ditadura militar. O próprio processo de eleição da presidência não demonstra estar atualizado, isso se não expandirmos para a eleição dos representantes dos atletas de cada modalidade.
"Na década de 1970, reinava a ditadura militar, sem previsão de que as eleições de cargos executivos de entidades autárquicas se submetessem aos trâmites legais e democráticos da Constituição aprovada somente em 1988. Ou seja, o Estatuto da FAN, mesmo fiel à sua fundação, precisaria de adaptações para melhor se enquadrar nos trâmites democráticos modernos. Tome-se como exemplo as eleições da maior entidade dos esportes aquáticos no Brasil, a CBDA, em que há representantes votantes das 27 federações, das 05 modalidades aquáticas e dos atletas", publicação citada (link).
O representante dos atletas seria um canal democrático para atender à demanda de cada modalidade, no entanto ainda sim seria preciso a FAN ter opção de uma "ouvidoria" ou algo parecido que atendesse aos pais e demais pessoas ligadas à comunidade aquática, como a criação do "Zap da FAN" (contato via WhatsApp). O que se via por outro lado, é que determinadas sugestões ou críticas não eram enviadas de forma "construtiva" ou pensadas no "todo", quando surgiam de uma realidade que se pretendia atender apenas a determinados indivíduos. Por outro lado, o representante dos atletas até então nem mesmo se fazia conhecer para participar e colher sugestões dos demais e assim expor diante de reuniões necessárias.
Por ter sido concebido durante ditadura militar, o estatuto da FAN carregava seu processo de eleição exclusivo condicionando clubes federados a se tornarem "filiados". A condição imposta não parece apresentar uma "contrapartida" atrativa pelos demais clubes federados e isso fez a presidência ser eleita por 02 ou 03 clubes diante de muitos outros que se mantiveram "fiéis" aos campeonatos de federados durante anos.
Por contrapeso democrático, o que se subentende é que por um lado existia uma realidade de estatuto aparentemente "defasado". Por outro, os próprios clubes e técnicos não demonstravam descontentamento suficiente para protestar algo que fizesse o estatuto se atualizar e abranger uma realidade democrática bem maior. Não seria preciso nem ódio, nem inveja nem ganância; o que era preciso era tão somente exercer um direito de cidadão com temperança e tranquilidade.
O que se aplica às demais federações do Brasil
Aqui no RN tivemos a intrépida coragem de expor uma realidade que em breve poderá se converter a favor dos atletas e equipes que abrilhantam nossas piscinas. No entanto, o que se ouve falar de outras federações por aí parece nem estar escrito! Presidente que já vai para o oitavo mandato, como se tivesse feito carreira exclusiva antes de se aposentar; federação com duas ou três diretorias apenas e sem representante de atletas; federação que inscreve atleta em norte-nordeste com tempo intuitivo sem ter sido numa competição oficial; federação que faz competição em piscina deteriorada ou sem higiene a ponto de causar acidentes e outras aberrações.
O que nos poderia parecer constrangedor diante do restante do Brasil não chega nem perto, se uma investigação minuciosa fosse feita pelo Ministério Público nas demais capitais do Brasil, a começar pelos estados vizinhos. Será se a forma de eleição das demais federações também atende à atual legislação do esporte? O que seria preciso para investigar a lisura do processo democrático das demais federações e associações do Brasil?
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