O conteúdo a seguir foi transcrito a partir de Curso de Arbitragem de Natação conferido pelo árbitro da FINA Marcelo Falcão, em Natal/RN, nos anos de 2009 a 2015, servindo como revisão de conteúdo ou mesmo reciclagem.
De acordo com o Prof. Marcelo Falcão, árbitro brasileiro da FINA que atuou em diversos campeonatos mundiais e nas Olimpíadas do Rio 2016, algumas definições e objetivos são essenciais durante a análise de regras oficiais quando de procedimentos a serem adotados durante uma competição de natação pela equipe de arbitragem.
DEFINIÇÕES DA ARBITRAGEM
O juiz (latim “judex”,
de “jus” – o direito – e “dicere” – dizer): no direito, o juiz é o magistrado
encarregado de administrar a justiça.
Arbitragem: julgamento amigável de uma
divergência; julgamento de um jogo, de uma prova, de uma competição.
Arbitrar: julgar e decidir como árbitro;
determinar e decidir por arbítrio os pontos omissos nas regras.
O árbitro (latim
“arbitru”): na antiguidade, era aquele que decidia os casos duvidosos num
torneio, duelo ou desafio. Atualmente, é aquele que fiscaliza a observância das
regras, intervindo sempre que sejam violadas. O árbitro exerce as mesmas
funções em provas desportivas, com direito e autoridade para julgar e de acordo
com as regras a dirimir dúvidas e aplicar penalidades ou sanções.
Arbítrio: resolução arbitrária; vontade que
prepondera sobre a lei; voto ou escolha, arbítrio das partes.
Livre-arbítrio: poder que a pessoa tem de escolher de
acordo com a sua vontade, de se determinar.
Decisão arbitrária: que não é determinada por lei, regra
ou tradição, tendo-se que se utilizar do “bom senso”.
Arbitrariedade: cometer arbitrariedade, ter
procedimento arbitrário, não previsto em lei, injustiça, capricho pessoal.
Poder discricionário: poder de autoridade, sem restrições,
sem limites; que não obedece a condições, que não está previsto em lei, regra
ou tradição.
Erro de direito: errar sem observar os preceitos
legais (leis, regras etc.). O erro de direito torna nula a decisão – anula o
jogo, a prova, a competição.
Erro de fato: ação, coisa feita, coisa realmente
existente. É um fato, isto é, sabido, conhecido. Questão de fato a que versa
sobre a existência da ação. O erro humano não invalida a decisão da arbitragem,
seja por desconhecimento das regras, seja pelo propósito de obter vantagem.
Um árbitro pode cometer erro de
direito, mas não erro de fato. Uma vez decidida sobre a atitude tomada, cabe ao
réu provar em contrário através da comprovação do erro de direito da
arbitragem; caso contrário, pelo menos um segundo árbitro conhecedor das regras
servirá de testemunha sobre quaisquer dúvidas contra algum árbitro.
OBJETIVOS DA ARBITRAGEM
Com o fim de assegurar uma competição o
mais justa possível, o juiz, seja ele árbitro geral, de nado, de partida,
inspetor de voltas, anotador, banco de controle ou anunciador, deverá observar
os seguintes objetivos:
1. Promover e melhorar a natação
2. Desenvolver o interesse e
participação na natação;
3. Encorajar aptidão física e melhorar
a qualidade da natação competitiva;
4. Promover atitudes positivas;
5. Ampliar oportunidades de treinar e
ganhar experiência;
6. Exercer honestidade e integridade;
7. Encorajar a franqueza;
8. Reconhecer o uso do bom julgamento;
9. Demonstrar certeza;
10. Admitir erros.
PRINCÍPIO FUNDAMENTAL
“O direito do réu prevalece sobre
qualquer dúvida”, ou seja: Quando existe uma dúvida sobre a atitude tomada
pelo réu (atleta), prevalece o direito do réu, um árbitro não pode tomar
decisões por desconhecimento das regras ou por dúvidas, a não ser com certeza e
convicção.
O ÁRBITRO
“Persona”: Máscara usada pelo ator no
teatro Grego e que caracterizava o personagem, dando-lhe personalidade.
“O Árbitro”: Ao arbitrar, usa a
personalidade da função e se transforma num personagem da maior importância na
competição.
CUIDADOS E RESPONSABILIDADES DO ÁRBITRO
1. Só iniciar uma competição depois de
vistoriar toda área da piscina (material adequado, duchas, raias, blocos de
partida etc.).
2. Deve estar higienizado(a), com o
melhor aspecto visual possível.
3. Deve estar consciente do personagem
assumido.
4. “Respeitar para ser respeitado” – o
respeito adquire-se. Re-ler sempre as regras, decidir sempre com a lei, com
certeza e convicção e na falta dela, com o bom senso.
5. Observar sempre as regras da FINA e
as disciplinares do Código de Justiça Desportivo.
6. Conferir depois de prontos os
resultados e só então autorizar sua publicação.
7. Na dúvida, decidir sempre a favor do
réu (atleta).
8. Jamais favorecer; julgar somente com
sua consciência.
9. Não premeditar, não pré-julgar.
10. Manter a moral elevada, tomar
atitudes positivas e ter o cuidado para passar sem ser notado.
11. Chamar a atenção de modo sutil a
algum colega-árbitro desatento.
12. Observar com cuidado sua conduta,
sua postura no desempenho de seu papel, não ser arbitrário, não cometer
arbitrariedade.
13. Não tomar atitudes em relação ao
público – ser impessoal; ouvir e calar, não discutir, não brigar.
14. Providenciar socorro médico à
atleta acidentado.
15. Fazer com que a competição
transcorra normalmente até o final; ficar atento a todos os detalhes na área da
competição.
16. Somente mudar quando para
beneficiar a rotina da competição.
17. Suspender o desenrolar da
competição a qualquer momento, para salvaguardar a integridade física dos
juizes, auxiliares e atletas, por motivo de intempéries (vendaval, tempestade,
etc.), conflito, brigas etc.
18. Ficar atento aos fatos não
previstos nas regras: “o errado é sempre feito às escondidas”.
19. Observar se o nadador está com óleo
no corpo.
20. É comum verificar atletas urinando
da partida, não tome nenhuma atitude.
21. Observar se um nadador está
instigando ao lado, xingando-o a fim de irritá-lo. Comunique a fato ao chefe ao
chefe/árbitro.
22. Verificar antes da prova se algum
nadador está portando material que o não adequado (proibido).
23. Se for cronometrista, nunca
divulgar o tempo ao atleta.
24. Se for juiz de voltas, observar no
nado de costas se o nadador vira sem tocar na borda, se houve propulsão (pernas
e/ou braços) após sair da posição de costas, se após a virada antes de nadar
ostenta a posição de costas; no nado de peito, se toca com as duas mãos, se ao
deslizar bate pernas no plano vertical, se dá mais de uma braçada submersa; no
borboleta, se ao tocar o faz com as duas mãos, se ao deslizar submerso bate
pernas alternadas; e se no nado livre ao virar toca a parede com qualquer parte
do corpo.
25. Não conversar com companheiros,
atletas ou técnicos durante o desenrolar de uma prova.
26. Se tiver dúvidas ao julgar, não
consultar ninguém, simplesmente omita-se.
27. Permaneça sentado enquanto não
estiver atuando.
28. Não comente com ninguém a atuação
do árbitro ou de qualquer outro auxiliar – todos são falíveis, mas ao errar,
tenha convicção que acertou.
29. Conferir a ordem de participação
dos atletas nas provas de revezamento, verificando as fichas e as carteiras de
identidade.
30. Observar o nadador que ameaça sair
escapado, balançando-se conscientemente, com o objetivo de fazer que
adversários desequilibrem (má conduta).
31. Se notar que algum nadador foi
incluído na prova, parar a competição e verificar se o mesmo está inscrito pelo
clube (houve falha da federação) e/ou está em outras provas.
32. Não permitir que técnicos entrem na
piscina com qualquer finalidade.
33. Se um atleta reclamar, não discutir
e orientar a falar com o árbitro geral; na reincidência, comunicar o fato ao
árbitro geral.
34. Numa chegada difícil entre dois
nadadores de peito e na qual os dois se juntam a raia que os separa, verificar
se algum usa artifício ilegal para vencer.
35. Numa prova de nado de costas, ou na
de medley ou nos revezamentos em quatro estilos, observar com atenção ao
nadador que nada junto à raia, pois ele poderá estar puxando a raia, olhe para
as pastilhas da raia.
36. Observar nas chegadas se um nadador
que já chegou, atrapalha com as pernas (por baixo da água) a um outro que está
chegando (revezamento).
37. Por ocasião das viradas, observe o
nadador que desvia e vai para cima do adversário, pois ele poderá atrapalhar,
puxando ou chutando.
38. Se ao executar uma virada o nadador
sai em outra raia, com a finalidade de prejudicar um adversário.
39. Nas chegadas alguns nadadores batem
propositadamente as mãos na água para confundir o cronometrista e os juizes de
chegada. Só pare o cronômetro quando o atleta bater na parede.
DEVERES DO ÁRBITRO GERAL
1. Ao chegar à piscina, dar uma volta
completa, observando se todo o material exigido está em condições normais de
uso; caso contrário, buscar providenciar.
2. Em seguida, observar se todos os
juizes e auxiliares estão em seus respectivos lugares.
3. Comunicar ao anunciador para chamar
os competidores da primeira prova.
4. Ao notar que os atletas já estão no
local a eles destinados (Banco de controle), sinalizar para que o anunciador
chame a 1ª prova/1ª série (final/semi-final); as demais séries serão à medida
que o último nadador da série anterior tocar a borda (chegar).
5. Transcorrida cada prova em todas as
suas séries, repete-se a rotina do item 4.
6. Quando, após a conclusão de cada
série ou prova, o chefe dos juizes ou assistente lhe entregar as papeletas (de
chegada e dos cronometristas) deverá conferi-las verificando se as chegadas
estão de acordo com os tempos registrados e em seguida rubrica-as e envia ao
anotador para lançar nas fichas dos nadadores.
7. Ao perceber que os nadadores estão
sentados nas cadeiras colocadas próximas as raias respectivas, dará 03 (três)
apitos curtos para que se aprontem e ocupem a parte anterior do bloco de
partida.
8. Ao notar que todos estão de pé atrás
do bloco, dará um apito longo para que os atletas subam em cima do bloco, em
seguida dará o sinal ao juiz de partida (braço esticado) entregando-lhe a
prova, deve continuar nesta posição até o sinal de partida ou se resolver
abortar a saída.
9. Observará todas as saídas, para
independente do juiz de partida confirmá-las ou não. Achando que uma partida
não foi boa, o árbitro apitará mandando baixar a corda imediatamente. Para
melhor efeito deverá estar colocado entre o juiz de partida (05 metros) e o
confirmador (15 metros).
10. Se a corda não cair, ou por
qualquer outro motivo a corda não cair sobre todas as raias, deixar a prova
terminar e tornar público que a prova está anulada e será corrida novamente. Os
nadadores da prova anulada ficarão aguardando no recinto da piscina a ordem do
árbitro para nadar novamente (bom senso).
11. Após uma boa saída, o árbitro
acompanhará toda a prova, inclusive viradas e chegadas, para em caso de dúvidas
ter condições ideais para resolvê-las, confirmando ou não as papeletas
recebidas (cronometristas - chegadas - inspetores de voltas e percurso, etc.).
12. Após ter observado as papeletas de
cada prova/série, ter feito correções e/ou desclassificação se for o caso,
enviará as papeletas corrigidas ou não, com a classificação dos competidores se
a prova for final.
13. Em caso de retirada de nadador da
prova (antes e/ou por ocasião da partida) por indisciplina ou má conduta,
comunica ao anunciador que torne público que o referido nadador está
desclassificado e a partida falsa não será contada. A retirada da prova poderá
partir do árbitro ou em concordância com a comunicação do juiz de partida.
14. Após a realização da última série
ou prova final, o árbitro deverá rubricar se achar correta a classificação
final, antes da mesma ser tornada pública. Em caso de dúvida, suspende a
realização da competição, vai à cabine de controle, confere as papeletas,
corrige ou não e autoriza a publicação.
15. Pode proibir o uso de qualquer
sineta, sirene, buzina ou outro qualquer barulho artificial durante a
competição.
16. Terminada a competição compete ao
árbitro ainda, em sua residência fazer a súmula da competição detalhando “IPSI
LITERIS VERBUM AD VERBUM” todos os fatos e ocorrências verificadas durante
todas as etapas da competição, lançando (se for o caso) nome de atletas,
técnicos, dirigentes, clube que porventura tenham sido culpados por má conduta
ou indisciplinas. Depois entregá-la na federação no prazo estabelecido.