O nadador chinês Jincheng Guo já havia se destacado nas Paralimpíadas de Paris 2024, por lançar uma técnica inovadora nas piscinas: um “escudo” feito de uma bolha de ar, posicionado à frente da cabeça. A estratégia voltou a lhe render medalhas no Mundial Paralímpico de Natação, em Singapura — o atleta, que não tem os braços, já faturou o ouro na prova dos 50 Livre.
Não sabemos se Guo gostava de física na escola, mas podemos atestar que o sucesso dele, aliado à sua impressionante destreza na água, tem total relação com a ciência. Professores de física foram entrevistados para entender os “segredos aquáticos” que impulsionam o atleta chinês ao pódio.
Guo fez a prova em 00:30.11, assegurando o topo do pódio. O ucraniano Artem Oliinyk, que fez em 00:31.42, ficou a prata e o bronze foi para o brasileiro Samuel Oliveira, com 00:31.67. Ao observar as provas dos 50 Livre, percebe-se que, enquanto Guo se movimenta, um “escudo” de bolha de ar permanece fixo junto à sua cabeça.
A física básica nos ensina que o ar oferece muito menos resistência ao movimento do corpo do que a água. Por isso, é mais fácil se mover em ambientes externos do que dentro de uma piscina. A técnica de Guo explora essa diferença. Ao mergulhar e nadar quase na superfície, o atleta chinês expira devagar e de forma contínua, alimentando essa camada gasosa que se forma bem à sua frente.
Dessa forma, a cabeça do nadador entra em contato com o ar da bolha, e não diretamente com a água da piscina. Isso tem um efeito fascinante: reduz o chamado arrasto hidrodinâmico — a resistência que a água oferece ao movimento.
"Na natação, o arrasto é o principal obstáculo da velocidade. No caso da bolha, cria-se uma camada de ar (película) à frente do nadador, reduzindo o atrito de Guo com a água", afirma Francisco de Assis Cavallaro, geofísico e professor de engenharia na Universidade Cruzeiro do Sul.
Consequentemente, ele ganha mais velocidade.
Como essa bolha não se desfaz nem estoura?
A resposta está na combinação da precisão técnica de Guo e de um conceito chamado tensão superficial.
Leandro Felix de Oliveira, analista de ensino de Física da Fundação Bradesco, define a ideia: "A tensão superficial é a força que mantém as moléculas da água mais unidas na superfície, como se fosse uma membrana elástica. No caso do nadador, ela age como uma barreira que segura a bolha de ar em frente à cabeça dele".
Ou seja: o nadador utiliza a tensão superficial, essa "película", como uma barreira de retenção. Ao entrar na água de forma suave, manter a estabilidade ao longo de todo o percurso e levantar a cabeça pouquíssimas vezes para respirar, essa tensão não é rompida, permitindo que a bolha continue intacta até o final da prova.
Thiago Almeida, professor de Física da Escola SEB Lafaiete, analisa a possibilidade de atletas sem deficiência usarem essa técnica. Nadadores que movimentam os braços criam uma zona de agitação e turbulência na água, dificultando a formação e a manutenção de uma bolha estável.
“O nadador que bater os braços vai ter naturalmente um arrasto associado à quebra da tensão superficial. Guo, nadando na superfície, não fica quebrando toda hora essa tensão – ou seja: não é ‘segurado’ pela água”, explica.
Mesmo entre outros atletas paralímpicos que nadam apenas com as pernas, a reprodução da técnica de Guo é difícil, dada a necessidade de extrema precisão e de controle respiratório para prender e empurrar o ar ao longo da prova.
Fonte: G1



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