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Papo de master – Como um fundista pode vencer um velocista

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Pode parecer até uma piada sem sentido, mas é possível extrair de uma disputa entre dois universos paralelos uma analogia capaz de demonstrar quem de fato manda na piscina. Nunca se soube que Michael Phelps tenha nadado uma prova de 50 metros, porém um comentário seu após o 4º lugar nos 400 Medley em Londres 2012 desperta algo que identifica uma atitude vencedora para além de simplesmente nadar. Se você nunca viu um fundista desafiar um velocista e ganhar dele nos 50 metros, uma analogia extraída da lição de Phepls demonstra que é possível sim. E o pior: contra o orgulho ferido do velocista.

Créditos: The Week


Entenda velocista aqui não como aquele que nada 50 ou 100 metros, mas aquele afoito que foge de uma série de 10 de 200 borboleta em A2 com 30 segundos de descanso entre cada tiro. Respirou fundo ao ter lido essa série? Analogamente, em nosso cotidiano encontramos pessoas fora da piscina como técnicos, professores, pais, amigos, árbitros, profissionais ou simples admiradores do esporte que agem como um velocista: querem resultados imediatamente rápidos. 

Um bom velocista treina muito exaustivamente em intensidade próxima de uma competição, embora o volume de treino gire em torno de 30 a 50% do volume de um fundista. Nadar uma prova como os 100 metros tendo que respirar o mínimo possível causa uma sensação de paralisia do tempo diferente de um fundista. É como se uma coisa compensasse a outra: enquanto num 800 metros é possível segurar o ritmo e controlar melhor a respiração, num 100 metros não se tem oxigênio o suficiente para terminar semelhante como começou. Nessas condições o cérebro parece anestesiado, e não dá tempo para sentir se está veloz como se pretendia: simplesmente o nadador sabe que precisa continuar usando o restinho de energia que sobra até o final. Na falta de oxigênio, estoura a produção de ácido lácteo que é o responsável por causar as dores musculares no final de uma prova de velocidade.

Ser velocista ou tornar-se velocista pode parecer a coisa mais fácil do mundo aquático: ao aprender a nadar, a primeira coisa que queremos é atravessar a piscina de 50 metros sem parar. Dessa tentativa, surge o tempo, para depois continuar tentando e tentando baixar cada vez mais esses 50 metros. Porém, com a repetição, isso acaba determinando uma atitude inconsciente que é querer resultados imediatos.

Resultados imediatos ou a longo prazo fazem parte de nosso dia a dia. O que pode ser confrontado é uma analogia retirada desses universos paralelos entre velocista e fundista. Na prática dificilmente um fundista venceria um velocista.

Em nosso dia a dia, a convivência com certas pessoas é análoga a um velocista quando fica cutucando um fundista, e isso se projeta em diversas dimensões de nossa sociedade. É chato demais perder tempo tentando elaborar uma forma de calar a boca daquele velocista teimoso e irritante, que quer resultados imediatos, enquanto se projetam resultados a longo prazo. No entanto, “sem querer querendo”, num momento de súbita derrota, Michael Phelps deixou uma lição. Ao chegar em 4º lugar e ver o brasileiro Thiago Pereira com a prata, Phelps o elogiou e disse: “Nadou com Inteligência”.

Um bom velocista mira a borda de chegada, respira o mínimo possível e não quer saber de quem esteja na raia ao lado antes de querer tocar em primeiro. Quem está ali na piscina sabe efetivamente quais as diferenças entre nadar 50, 100, 200, 400, 800 ou 1500 metros. Mas e se numa prova como os 400 Medley, um nadador tentasse nadar como quem faz 50 metros? A gente sabe que é loucura ou até “suicídio” esse tipo de atitude. Ainda para piorar, se aquele mesmo nadador tentasse por várias vezes a mesma estratégia e nunca dar certo?! O que a lição de Phelps tem a ver com o sucesso de uma conquista como aquela prata de Thiago Pereira?

“Nadar com inteligência”! Não existe outra forma melhor de um fundista vencer um velocista. Nem sempre sua prova exige apenas emprego de força e técnica ou de treinamento exaustivo. Nem sempre aquela medalha é conquistada apenas olhando pra borda e desprezando quem está na raia ao lado. Se Phelps reconheceu que sua estratégia foi vencida, percebe-se que nem toda conquista parece ser tão superficialmente um “desfile” dentro d’água. Há um jogo altamente articulador de estratégia muito bem elaborada em que tudo pode acontecer até os últimos 35 metros, isso para quem faz parte da grande elite mundial da natação. Que o diga o próprio Thiago Pereira, que foi 2º lugar nos 200 Medley do Rio 2016, pelo menos até os 165 metros... Ah você não sabia?! Só que a prova eram 200 metros, daí então ele tocou a borda muito longe do pódio, em 7º lugar.

Nadar com inteligência exige muito mais que um simples perímetro retilíneo a percorrer numa distância. Nadar com inteligência vai além dos treinos tipo “control+C contro+V”, copiados de um treinador aqui ou de um finalista olímpico ali. E se você for mais perspicaz que o Michael Phelps, irá deduzir por si só que nosso cérebro tem dois pólos, num deles reside a inteligência racional e no outro, a inteligência emocional. Phelps finalizou aquela prova em 4º, soube ser humilde o suficiente a ponto de elogiar nosso medalhista de prata, mas quem o viu com orgulho ferido depois disso?

Se ao tocar a borda qualquer que seja o tempo, qualquer que seja a classificação, você não se sente o suficientemente satisfeito consigo mesmo, algum distúrbio de inteligência racional ou emocional com certeza você tem. Daí a possibilidade de um fundista, embora em seu universo próprio, ser capaz de vencer um velocista.



Créditos: The New York Times


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